Bem, sou o capitão do navio Santa Emília
e parece que iniciaremos mais uma grande aventura. Um homem chamado Vasco
Fernandes me procurou aqui em Porto, uma pequena cidade de Portugal para
contratar meus serviços por um bom preço, confesso que irrecusável. Ele ganhou umas
terras em uma ilha bem distante daqui de Portugal chamada Ilha de Vera Cruz e
necessita de mão de obra barata para iniciar sua vida naquele local, sabendo-se
que não existe nada lá.
E qual será minha tarefa? Bem, minha
tarefa será contratar alguns marinheiros e mercenários para uma viagem ao
sudeste da África com o intuito de capturar alguns negros para encaminhar à
Ilha de Vera Cruz para o trabalho escravo que será necessário para a construção
de casas e trabalho em lavouras naquela região.
Arrendei um navio de propriedade do Sr.
Valentino e agora preciso da tripulação.
É difícil se contratar bons homens por
aqui, como disse, eles não são confiáveis, são mercenários e difíceis de serem
controlados. Mas é necessário correr contra o tempo e contar com um pouco de
sorte.
Depois de contratada a tripulação,
suprimos o navio com mantimentos necessários a longa viagem e partimos rumo ao
desconhecido, e certos de termos grandes e inesquecíveis aventuras naquele
período em alto mar.
No início tudo ocorreu tranquilamente
sob o meu comando, alguns homens passaram mal em alto mar, mas nada que o tempo
não pudesse resolver.
Primeira tempestade em alto mar, uma
experiência inesquecível. Parecia que iríamos morrer todos ali, tragados por
tanta água... O terror tomou conta do navio, muitos homens se apavoravam,
alguns gritaram incessantemente, como loucos, outros se ajoelhavam e clamavam
ao seu Deus, Todo Poderoso por um milagre. Milagre este que ocorreu após
algumas horas de terror. Creio que Deus estava com seus olhos voltados para
nós, e nos protegeu dentro daquele navio para que não fossemos tragados pelo
mar.
Depois daquela noite terrível passamos
por um longo tempo de calmaria, até que em um belo dia alguns homens depois de
beberem um pouco além da conta começaram a brigar em alto mar, esta bebida
desgraçada chamada Rum ainda vai acabar com este povo. Um homem caiu ao mar
devido à briga na proa e foi um rebuliço na tripulação, mas continuamos na
mesma força e nosso Deus Todo Poderoso, que continuava nos observando naquela
viagem novamente nos livrou do pior, o homem conseguiu ser regatado são e
salvo, creio que a partir daquela data aquele homem não mais iria beber.
Depois de alguns meses, chegamos enfim
ao sudeste da África, numa localidade chamada Nairóbi, no Quênia para capturar
os negros para servirem de escravos. Apesar de haver um mercado livre onde se
vendem estes negros precisaríamos capturá-los para que houvesse um lucro maior
nesta viagem.
Ancoramos o navio perto a praia e
descemos nos barcos. A captura foi difícil, houve muita luta, estávamos
armados, o que facilitou nosso trabalho, alguns homens morreram e seus corpos ficaram
ali mesmo naquela localidade, não tínhamos como levá-los e nem como dar um
enterro descente a eles, pois ficamos com medo de mais um confronto com aquele
povo, eles eram bons guerreiros e lutavam com determinação para se defender. Mas perante todos estes problemas que
enfrentamos nesta primeira aventura conseguimos cerca de cem negros, sem contar
com as mulheres e crianças que também vieram juntos, muitos gritavam e
choravam, falavam uma língua desconhecida para mim.
Creio que o pagamento por estes negros
será compensador, o Sr. Vasco Fernandes pagaria por cabeça, e confesso que o
preço é bom, conseguirei organizar minha vida com esta viagem, quem sabe ter
algum dia uma bela casa para minha família e um título de nobre, isto custa
caro em nosso país.
Alguns marinheiros iniciaram uma pequena
algazarra para se aproveitaram das mulheres negras, mas conseguimos detê-los
com muito custo e ameaças de prisão.
O choro daqueles negros durou semanas,
as crianças e algumas mulheres começaram a passar muito mal, infelizmente
algumas não resistiram e morreram. Seus corpos foram jogados ao mar, o qual
causou um grande desespero e revolta naquele povo.
Ontem ouvi uns marinheiros mais
experientes conversando sobre os negros, eles diziam que lá existe uma
hierarquia igual a nossa: reis, príncipes e servos, foram difíceis de
acreditar, reis? Difícil um povo que se deixa capturar desta forma ter rei.
Mas fiquei a pensar sobre eles, eu os
olhava da minha cabine, eles conversavam entre si, alguns até estavam sorrindo,
o que será que eles pensam? Será que são como nós, os brancos?
Pergunta difícil
de ser respondida... Espero que algum dia eu possa ter uma resposta plausível
para ela.
Foi encaminhado a minha cabine uma
negra para fazer a limpeza, ela me olhava com muito medo, o terror saltava em
seus olhos, para ela eu era um monstro, e ela para mim parecia um animal
inofensivo, que queria fugir de seu dono.
Por fim chegamos ao nosso destino: Ilha
de Vera Cruz, uma terra muito grande, praias lindas, nunca antes observadas por
ninguém, parecia que a paz reinava naquele local, existia muita vegetação,
florestas enormes, deve haver muitos animais selvagens por ali, de longe
parecia interessante estar naquele local, parecia ser promissor morar ali.
Alguns portugueses não muito afortunados, mas que
contavam com a graça do rei, ganharam a terra para morar e cultivar, não tinham
nada a perder e queriam fazer fortuna naquele local. Na realidade Portugal só
estava querendo proteger seu novo território para que ele não fosse invadido
pelos ingleses, espanhóis, entre outros. Quer proteção melhor que esta? Ele
dividiu a terra em capitanias e as “doou”, o Vasco Fernandes ficou com uma
capitania em um território chamado Espírito Santo. E é aqui que estamos...
Ancoramos o navio ali e descemos nos
barcos para a praia, para minha surpresa fomos recebidos por um novo povo, eles
eram morenos, de cabelos negros e acreditem, andavam nus. Aquilo deixou a
tripulação confusa, que povo mais estranho é esse que anda sem roupas. Por fim
chegaram o Sr. Vasco Fernandes e seus homens para nos recepcionar.
Eles contaram sobre aquela pequena ilha
e o povo que ali vivia. Eles até tentaram utilizá-los no trabalho, o que parece
que não deu muito certo, pois eles adoravam dormir em redes, não gostando muito
de trabalhar.
Aprenderam a cultivar vários alimentos
com eles, alimentos estes que não conheciam, mas que começaram a apreciar.
Negociações
feitas, pagamento acertado e resolvemos permanecer por ali até o navio ser
suprido com alimentos para a viagem de volta a Portugal.
O povo era bem hospitaleiro, gostavam de
dançar, pintar seus corpos, fumavam todos juntos e também utilizavam bebidas em
suas festas, dormiam em um tipo de cabana feita de folhas de palmeiras e todos
juntos.
Foi interessante permanecer por ali,
aprendemos muita coisa diferente. Às vezes me pergunto se realmente esta ilha
foi descoberta ou invadida, pois se aqui já existia um povo que dominava e cultivava
a terra de forma bem intima e cautelosa.
Chegamos ao fim,
depois do navio abastecido e a tripulação já descansada e bem alimentada
retornaremos. A viagem de volta foi mais tranqüila, sem grandes tumultos e
tempestades avassaladoras para nos amedrontar, creio que o Deus Todo Poderoso cuidou
de nós neste percurso que fizemos. Fui recebido pela minha família, agora estou
mais tranqüilo, pois tenho um porto seguro em meu lar onde poderei descansar
sem me preocupar com o que o mar me reserva. Compramos uma casa maior, de
frente ao mar em Porto, onde morávamos, uma pequena cidade de Portugal.
Foram tantas as aventuras que passamos
ali naquele grande e extenso mar que nunca mais irei esquecer, aprendi muito
com os negros e também com os índios, creio que eles são uns desafortunados,
como eu fui um dia...
São inteligentes, pensam, sentem, mas
não são aceitos como pessoas. Mas os camponeses, que são chamados de “plebeus”
também não são bem aceitos.
Na realidade os nobres consideram todos
diferentes deles, só eles reinam e comandam este imenso universo, espero que
isto um dia acabe e que todos possam viver com direitos iguais, onde reina a
justiça e o amor.
Eu, Sr. Ryan Valentim Oliveira, casado
com Nany, antes apenas capitão do navio Santa Emília, agora proprietário, deixo
aqui registrado a minha primeira grande aventura em alto mar.
Nenhum comentário:
Postar um comentário